O artista Autista, Uma história emocionante... Oliver Sacks - Linda História.. ( Daniela Bolzan)
Autismo - Uma História emocionante...
- O ARTISTA AUTISTA Oliver Sacks In: O Homem que confundiu sua mulher com um chapéu Organizado por Norma Escosteguy
- JOSÉ, 21 anos, magro, de aparência frágil. Era considerado irremediavelmente retardado. Estava hospitalizado porque tinha tido um de seus violentos ataques. Ainda estava agitado e inquieto, quando foi visto pela primeira vez por Oliver Sacks . - Desenhe isto – pediu-lhe, entregando a José seu relógio de bolso. - Ele é um idiota, não sabe dizer as horas – falou o assistente. - Não consegue nem falar. Dizem que ele é “autista”, mas eu acho que ele não passa de um idiota. José ficou pálido, talvez mais devido ao tom, do que ao conteúdo dessas palavras. - Vamos – disse O.S. Eu sei que você vai conseguir.
- De imediato calmo, José pegou o relógio cuidadosamente, como se fosse uma jóia, colocou-o à sua frente, concentrado e imóvel. José desenhou com tranqüilidade e concentração, rápido e minucioso, sem necessidade de apagar, desligado de tudo o mais. José desenhou o relógio com notável fidelidade, com todas as características essenciais: a hora, os segundos, a presilha de forma trapezoidal. Os números eram de tamanhos, forma e estilos diferentes. Sua compreensão geral revelou-se surpreendente. E havia uma estranha mistura da precisão exata, até mesmo obsessiva, com curiosas (e engraçadas) elaborações e variações.
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- Oliver Sacks , após lhe ter receitado, por telefone, uma mudança nos anti-convulsivantes , devido às crises, permaneceu intrigado com José e decidiu vê-lo de novo. Foi recebido com um sorriso tímido, inesperado, que iluminou o rosto antes inexpressivo e indiferente. - Tenho pensado a seu respeito, disse. Quero ver mais desenhos. E mostrou-lhe uma revista ricamente ilustrada, que utiliza com finalidades neurológicas , para testar seus pacientes. De um artigo sobre pescaria, onde havia um rio, pedras e árvores, destacou uma truta, que saltava, em primeiro plano. - Desenhe isto, disse, apontando para o peixe. Ele sorriu e, com óbvia satisfação, desenhou seu próprio peixe.
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- O peixe de José era intensamente expressivo, com uma boca grande e cavernosa, de baleia, um olhar humano, uma espécie de “peixe-gente”. Agora, tratava-se de compreender a imaginação, a memória visual, a atenção e até o humor de José – que não eram esperadas num autista. Alguns anos antes, numa clínica especializada em neurologia infantil, quando apresentava “crises intratáveis”, não tinha havido dúvidas de que se tratava de um autista.
- As crianças autistas apresentam desempenhos e habilidades baseadas apenas em cálculos e memória, não em alguma coisa imaginativa ou pessoal. Seus desenhos – quando ocorrem, são meramente mecânicos, nunca criativos.
- O que acontecera com José então?
- Como havia chegado ao estado em que estava?
- E que estado era esse – seria possível fazer alguma coisa?
- A HISTÓRIA DE JOSÉ Aos oito anos , José apresentara febre muito alta , associada com o início de crises incessantes, e subseqüentemente continuadas, e o rápido aparecimento de uma condição de lesão cerebral ou autismo ( desde o início houve dúvidas diagnósticas). Seu líquor estivera anormal durante a fase aguda da doença, uma provável encefalite. Os EEGs mostravam grave perturbação lobo-temporal, tanto à direita, como à esquerda (Fatores orgânicos). Esta perturbação justificava suas crises convulsivas de tipos muito variados: grande mal, pequeno mal e “psicomotoras” complexas.
- José, que até então fora “normal” (segundo seus pais), tornou-se “mudo” e parou de falar com os outros, quando ficou doente.
- A capacidade de desenhar, que apresentava desde tenra infância, e que talvez fosse familiar (seu irmão era um artista de sucesso e o pai sempre desenhara), aparentemente fora poupada.
- Ao se instalar a doença, com até 20 crises convulsivas por dia, de diferentes tipos, José deixara de estudar, perdera a fala e entrara numa trágica situação de regressão geral intelectual e emocional.
Os lobos temporais estão associados também com as capacidades auditivas, e, em particular, com a percepção e produção da fala.
- José foi rotulado definitivamente como uma criança epiléptica, autista, retardada, talvez afásica. Foi considerado não educável, incurável e genericamente irremediável. Aos 9 anos, “desligou-se” da escola, da sociedade, de tudo aquilo que para uma criança normal constituiria a “realidade”. Durante 13 anos não saíra de casa, aparentemente devido às “crises intratáveis”, apesar das várias tentativas medicamentosas.
- Durante seu confinamento, não havia perdido de todo sua vida interior: demonstrava paixão por revistas ilustradas, especialmente de história natural, e, quando podia, entre crises e repreensões, encontrava tocos de lápis e desenhava o que podia . Assim se mantivera seu único elo com a realidade. Mas nada disso teria sido revelado, se não tivesse tido uma crise de fúria repentina, assustadora e sem precedentes – um acesso em que os objetos foram estilhaçados – que levou José a um hospital pela primeira vez.
- O que provocara esta fúria está longe de ser esclarecido: - uma erupção epilética (tal como se observa, em raras ocasiões, nas crises lobo-temporais muito graves); - simplesmente uma “psicose”, como constava na sua ficha de admissão; - ou um pedido de socorro, extremo e desesperado, de uma alma torturada que se achava muda e sem uma forma direta para expressar sua difícil situação, suas necessidades.
- O que ficou evidente foi que sua vinda para o hospital, com as crises “controladas” por novas e poderosas drogas, deu-lhe pela primeira vez algum espaço e liberdade, uma “libertação” fisiológica e psicológica de uma espécie que ele não conhecera desde os oito anos.
- O hospital foi bom para José, como os asilos, no melhor sentido da palavra: lugares que proporcionam refúgio para as almas atormentadas, assaltadas por perturbações, com aquela combinação exata de ordem e liberdade necessárias.
- Em casa, sofrera confinamento e cativeiro: epilepsia e caos em sua vida.
- A EVOLUÇÃO DE JOSÉ Na terceira vez que Oliver Sacks decidiu vê-lo, não o mandou chamar e foi direto à enfermaria, sem avisá-lo. José estava sentado, embalando-se, os olhos fechados, um quadro de regressão. O.S. teve uma sensação de terror ao vê-lo, pois cultivara a noção de uma “rápida recuperação”. Foi preciso ver José numa posição regredida (como tornaria a ver, repetidas vezes), para observar que não havia um “despertar” simples para ele, e sim um caminho carregado de um sentimento de perigo, de duplo risco, tão aterrorizante quanto excitante –porque ele acabou amando as grades de sua prisão.
- Assim que José ouviu Oliver Sacks chamá-lo, saltou e, ansioso e voraz, seguiu-o até a sala de desenhos. O médico deu-lhe uma caneta e disse: “Aquele peixe que você desenhou”, sugeriu, fazendo um gesto no ar, “aquele peixe, você pode lembrá-lo e desenhá-lo de novo?” Ele fez que sim com a cabeça, ávido, e pegou a caneta. Já fazia três semanas: o que ele desenharia agora? Ele fechou os olhos por um momento – e então desenhou. Era uma truta, com narinas (humanas?), a cauda em forquilha, e lábios desenvolvidos. Ele ia pegar a caneta, quando José prosseguiu. Rapidamente, esboçou um pequeno peixe, um companheiro, dando cambalhotas, em óbvia brincadeira. Depois desenhou a superfície da água e uma súbita onda elevando-se.
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- Enquanto desenhava, José foi ficando excitado e emitiu um grito estranho e misterioso . Repleto de reflexões e simultânea precaução, O.S. ofereceu a caneta de novo a José, apontando apenas com um gesto, um pássaro, num cartão de Natal que estava sobre a mesa. O pássaro foi desenhado com precisão e ele usou uma caneta vermelha para o peito. Os pés pareciam garras, fortemente agarradas ao tronco. Mas, o que estava acontecendo? O galinho seco do inverno desenvolvera-se no desenho e expandira-se em florescências. José havia transformado o inverno em primavera!
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- Então, ele começou a falar – embora fossem sons estranhos, hesitantes, extremamente ininteligíveis, que brotavam, espantando-o, às vezes, tanto quanto à equipe, pois todos o consideravam irreversivelmente mudo. E aqui também foi impossível afirmar o quanto era “orgânico”, o quanto era questão de motivação. Suas perturbações lobo-temporais tinham sido reduzidas – seus EEG nunca eram normais, mostrando alterações nas ondas lentas, pontudas, disritmia. Mas eram bem melhores do que os iniciais, quando chegara.
- Havia prejuízos em suas habilidades para usar, compreender e reconhecer a fala, com o que ele teria que lutar.
- Porém, o mais importante era que ele estava brigando para se recuperar (encorajado pela equipe e guiado por um terapeuta da fala).
- Abandonara a desesperança , provável masoquismo e a recusa de comunicação com qualquer pessoa, que o mantivera isolado.
- Entregava-se ferozmente ao desenho , como auto-expressão.
- Não se esperaria que ele voltasse a falar normalmente, mas poderia expressar suas necessidades mais simples.
- Último episódio : José foi removido para uma ala do hospital com uma equipe projetada para pacientes autistas, que lhe oferecessem “um lar para o coração”. Quando Oliver Sacks foi vê-lo, acenou espontaneamente, mostrando a porta, queria sair. Ele seguiu na frente, mostrando o caminho para o jardim ensolarado, de vegetação exuberante. (Nunca mais havia saído de casa, desde os 8 anos.) Colocou a prancheta no chão e desenhou flores, que olhava atento aos detalhes. Mostrava seu amor por essa realidade. A mente de José não fora constituída para o abstrato, para o conceitual. Isso não lhe era acessível. Mas o caminho particular da natureza é também um caminho para a realidade e para o verdadeiro.
- No autismo infantil “clássico” (primário) que se manifesta totalmente antes dos três anos, a separação dos outros acontece tão cedo, que pode não haver memória da ligação. No autismo “secundário” , como o de José, causado por uma lesão cerebral num estágio mais adiantado da vida, há alguma memória, talvez uma certa nostalgia. Isto pode explicar por que José foi mais acessível e pode mostrar, através dos desenhos, uma interação acontecendo .
- Para a pessoa autista, o abstrato, o categórico, não tem interesse – o concreto e o singular é tudo. Entretanto, a imaginação autista não é rara. Quanto mais os vejo, diz Oliver Sacks , mais me parecem uma estranha espécie entre nós, esquisita, original, totalmente voltada para dentro, diferente dos outros. José poderia fazer muitas coisas, mas só o fará se tiver alguém muito compreensivo, com meios e oportunidades, para guiá-lo. Como muitos outros autistas .
- Perda da fala e de capacidades adquiridas. Ausência de contato afetivo. Atitudes bizarras. Dificuldades na mutualidade social: olhar , sorriso, gestos, fala. Ecolalia.Dificuldade de contato físico. Atração por movimentos circulares. “ Flapping”. Marcha na ponta dos pés. Preferência por objetos inanimados. Insensibilidade a perigos e à dor. Crises clásticas. Ausência de empatia. Sintomas Após 2 anos e mais tarde Desde o nascimento (antes de 3 anos) Idade Fatores psicológicos Fatores orgânicos? Genética? Fatores orgânicos? Etiologia AUTISMO SECUNDÁRIO AUTISMO PRIMÁRIO (Autismo de Kanner, 1943)
- X Espectro variável Aprendizagem Etiológico, medicamentoso, Adequado às necessidades Centros especializados, intervenção precoce e intensiva, visando o desenvolvimento de capacidades, especialmente do olhar, compreensão de expressões faciais e convívio Tratamento X Espectro variável 70% com retardo Inteligência X 5 em cada 10 000 crianças 4 vêzes mais freqüente em meninos Incidência AUTISMO SECUNDÁRIO AUTISMO PRIMÁRIO (Autismo de Kanner, 1943
Daniela Bolzan...
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